A Quem Interessa a Limitação Regional da Libras?

O texto aborda a limitação regional da Libras (Língua Brasileira de Sinais) e suas consequências para a inclusão social e a dignidade dos surdos brasileiros. Destaca o isolamento linguístico da Libras em contextos globais e sua violação a direitos constitucionais, como a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e a igualdade de direitos (art. 5º). Aponta os desafios enfrentados pelos surdos em viagens internacionais, a falta de políticas públicas voltadas à integração global e as falhas estruturais que perpetuam a exclusão. O texto propõe soluções como educação bilíngue, tecnologia inclusiva e intercâmbio cultural para promover a dignidade e a inclusão global da comunidade surda.

Rogério Santos do Nascimento

1/15/20254 min read

A condição dos surdos-mudos no Brasil levanta questões profundas sobre a inclusão social e a dignidade humana. A Libras (Língua Brasileira de Sinais), reconhecida como meio oficial de comunicação desde 2002, é uma conquista importante. Contudo, sua limitação geográfica ao território brasileiro gera dúvidas: por que não existe um esforço significativo para ampliar o alcance da Libras ou integrá-la a sistemas globais de comunicação? A quem interessa essa limitação? Essa reflexão vai além de aspectos educacionais e atinge questões estruturais e políticas que perpetuam a exclusão.

O Histórico da Libras e seu Isolamento Linguístico

A Libras foi moldada por influências históricas e culturais que remontam ao século XIX. Desenvolvida a partir da Língua de Sinais Francesa, ela adquiriu características únicas que refletem a identidade brasileira. Contudo, sua especificidade também resultou em isolamento. Diferente de idiomas falados, as línguas de sinais não possuem um padrão universal, e cada país desenvolveu seu próprio sistema, dificultando a comunicação entre surdos de diferentes nações.

Esse isolamento não é apenas uma questão de identidade cultural; ele também reflete uma negligência histórica em promover a interoperabilidade entre os sistemas de línguas de sinais. Enquanto outros países investem em tecnologias e programas que incentivam a comunicação global, o Brasil permanece focado em atender demandas locais, deixando os surdos brasileiros desamparados em contextos internacionais.

A Falta de Dignidade e a Violação de Direitos Constitucionais

A limitação da Libras como língua regional não é apenas uma falha estrutural; é também uma violação direta à dignidade humana, conforme garantido pelo artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, que estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Além disso, o artigo 5º assegura a igualdade de direitos e a inviolabilidade da liberdade e segurança a todos os brasileiros, incluindo pessoas com deficiência. A falta de acesso a uma comunicação global limita a autonomia dos surdos, violando princípios constitucionais fundamentais.

A situação também afronta o artigo 208, inciso III, que garante o direito à educação especializada às pessoas com deficiência. Sem um esforço de integração linguística global, o direito à educação plena e inclusiva fica comprometido, expondo uma negligência sistêmica.

Quem Ganha com a Exclusão?

A limitação regional da Libras pode ser vista como reflexo de uma estrutura política e social que perpetua desigualdades. A falta de incentivo à padronização ou ao aprendizado de outras línguas de sinais beneficia instituições que não desejam investir em acessibilidade ou em recursos globais para surdos. Governos, sistemas educacionais e até mesmo o mercado de trabalho permanecem inertes, economizando recursos ao ignorar a necessidade de integração global.

Além disso, a exclusão mantém os surdos brasileiros dependentes de um sistema que não prioriza a mobilidade ou a inclusão internacional. Grandes empresas de tecnologia, por exemplo, poderiam desenvolver plataformas inclusivas que conectassem surdos de diferentes países, mas muitas vezes optam por soluções mais lucrativas que atendem apenas mercados majoritários.

O Impacto em Viagens Internacionais

Imagine um surdo-mudo brasileiro em uma viagem internacional, enfrentando emergências como a perda de documentos ou a necessidade de atendimento médico. A Libras, desconhecida fora do Brasil, torna-se um obstáculo intransponível. Diferentemente de viajantes que conseguem recorrer ao inglês ou espanhol, o surdo encontra-se vulnerável, sem ferramentas para se comunicar efetivamente.

Em um aeroporto, por exemplo, o surdo pode ser incapaz de explicar sua situação para a equipe de atendimento. Hospitais, hotéis e até restaurantes também não possuem suporte para línguas de sinais internacionais. Esse cenário não apenas compromete a experiência do viajante, mas também expõe a fragilidade de um sistema global que ignora as necessidades dessa comunidade.

Por que não Avançamos?

A ausência de iniciativas para superar a limitação regional da Libras revela prioridades distorcidas. Enquanto campanhas de inclusão ganham visibilidade, elas frequentemente se limitam a ações locais, sem abordar o impacto global. Falta interesse político e econômico em promover mudanças estruturais que exigiriam investimentos em educação bilíngue, tecnologias inclusivas e programas de intercâmbio para surdos.

Soluções para um Futuro Inclusivo

Para reverter esse cenário, é necessário um esforço coletivo que inclua:

  1. Educação Globalizada: Inserir o aprendizado de línguas de sinais estrangeiras no currículo educacional brasileiro, criando conexões com outros sistemas.

  2. Incentivo à Pesquisa: Financiar estudos sobre a interoperabilidade entre línguas de sinais e o desenvolvimento de padrões globais.

  3. Tecnologias Inclusivas: Desenvolver aplicativos e plataformas que permitam a tradução simultânea entre diferentes línguas de sinais.

  4. Intercâmbio Cultural: Promover encontros internacionais entre surdos para fomentar a troca de experiências e ampliar a compreensão linguística.

  5. Políticas Públicas: Criar leis que exijam treinamento em línguas de sinais para profissionais em setores estratégicos, como saúde, turismo e transporte.

Conclusão

A limitação regional da Libras não é apenas um problema educacional ou cultural; é uma questão política e estrutural que perpetua a exclusão dos surdos brasileiros no cenário global. A falta de investimentos em inclusão internacional beneficia aqueles que lucram com a estagnação, enquanto a comunidade surda continua vulnerável. Somente por meio de ações concretas e globais será possível garantir a dignidade e a integração dos surdos-mudos brasileiros em um mundo cada vez mais interconectado.